A consciência do Corpo de Cristo

quarta-feira, 13 de agosto de 2008



Nos assuntos espirituais, o conhecer a doutrina sem ter consciência dela não serve para nada. A vida, mesmo humana ou animal, é bastante difícil de se tocar ou definir. Entretanto, todos podem reconhecê-la por causa do que chamamos de consciência. Sabemos que temos vida dentro de nós por causa das sensações e reações aos estímulos exteriores que ela produz no nosso interior. Assim também é com relação à vida divina dentro de nós.

Por exemplo, um aspecto da consciência da nova vida de Cristo em nós é a reação ao pecado. Uma pessoa que nasceu de novo não deixa de mentir somente porque outra pessoa lhe disse que é errado mentir; se não houver uma consciência interior, um sentimento de inquietação e tristeza quando mente, ela nunca deixará de mentir, mesmo que tenha conhecimento da doutrina bíblica. O que caracteriza o cristão é ter presente essa consciência da vida, não somente regras externas; aquele que não tem vida e consciência interior não é cristão.

Com respeito ao Corpo de Cristo é a mesma coisa. Todos os que conhecem o Corpo de Cristo terão a consciência da sua realidade. Se você verdadeiramente viu o Corpo, não apenas como doutrina, mas como uma manifestação coletiva da vida de Jesus na Terra, essa vida é uma experiência e não pode deixar de manifestar-se como uma consciência no seu interior.

De acordo com 1 Coríntios 12.26, a vida do Corpo faz com que o sofrimento ou o regozijo de um membro seja sentido por todos. Ainda que os membros sejam muitos, a vida é uma, e a consciência também é uma.

Tome como exemplo a pessoa que tem uma perna artificial. Ainda que pareça semelhante à outra perna, ela não tem vida. Portanto, não tem consciência do corpo: quando os outros membros sofrem, essa perna artificial não sente nada. Todos os outros membros têm o mesmo sentimento porque possuem uma vida em comum. Somente a perna artificial não tem esse sentimento, porque não tem vida.

Não se pode imitar a vida, nem é necessário tentar fazê-lo. Se existe vida, a imitação não é necessária; se não existe vida, ainda assim é impossível imitá-la. A expressão mais distintiva da vida é sua consciência de si mesma, o dar-se conta dela. Portanto, um cristão que vê a vida do Corpo terá inevitavelmente a consciência do Corpo, junto com os outros membros.

Consciência do Corpo e Sectarismo

Alguém que tem visto o Corpo de Cristo, e que por conseguinte possui a consciência do Corpo, sente-se destroçado por dentro quando faz algo que pode causar dissensão ou dividir os filhos de Deus; porque ele ama todo o que pertence a Deus e não pode dividir seus filhos.

O amor é natural ao Corpo de Cristo, enquanto que a divisão lhe é estranha; não importa por quantas razões levante-se uma mão contra a outra, é impossível para elas romperem a relação entre as duas: a divisão é simplesmente impossível.

Por essa razão, demo-nos conta de que todo espírito sectarista, toda atitude que leva à divisão, toda ação exterior ou pensamento interior que divide os filhos de Deus são sinais evidentes de não se conhecer o Corpo de Cristo.

Consciência do Corpo e Individualismo

Uma verdadeira visão do Corpo de Cristo nos resgatará do sectarismo; também nos resgatará do eu e do individualismo. Quão triste é que o princípio de vida de muitos não seja o Corpo, mas o indivíduo!

Podemos descobrir esse princípio do individualismo em muitas esferas. Por exemplo, em uma reunião de oração, alguém pode orar só por sua conta, pois não consegue orar com os demais. Seu corpo físico pode estar ajoelhado junto com os demais, entretanto sua consciência está limitada ao seu próprio ser. Quando ele ora, quer que os demais o escutem; porém quando os demais oram, ele não os escuta. Ele não tem nenhuma resposta interior à oração do outro e é incapaz sequer de acrescentar um ‘amém’.

Sua consciência está desconectada da consciência dos demais. Portanto, ele ora suas próprias orações e deixa que os outros orem as orações deles. Não parece haver nenhuma relação entre suas orações e as dos demais. Quando ele chega à reunião, parece vir só com o propósito de pronunciar as palavras que estão dentro dele e, depois, sente que sua tarefa terminou. Ele não se importa com o encargo da oração e nem com a consciência que os demais têm desse encargo. Esta é a regra do individualismo, não o princípio do Corpo. De fato, ele não tem visto o Corpo e, portanto, não pode cooperar com os demais diante de Deus.

Às vezes, três ou cinco, ou até mesmo dez ou vinte irmãos, em uma reunião, falam, cada um deles, somente daquilo que afeta a si mesmos, sem se mostrarem interessados pelos assuntos do próximo e nem por escutar o que os demais pensam. Ou, pode ser que, enquanto você ou outro irmão estejam juntos com essa pessoa, ela fale animadamente de algo que lhe afeta durante um bom tempo; porém, quando você ou os outros tomarem a palavra, ela apenas escuta, sem demonstrar tanto ânimo.

Em coisas tão pequenas como essas, você pode ver se uma pessoa realmente tem discernido o Corpo de Cristo.

A praga do individualismo pode crescer desde o simples fato de expressar o individualismo de uma só pessoa até expressar o individualismo de um grupo de várias pessoas. Você pode ter notado que na igreja poderá haver três ou cinco pessoas, quem sabe até oito ou nove pessoas, que formarão um círculo pequeno. Só esses poucos pensam o mesmo e “amam-se” uns aos outros. Eles não se enquadram com os demais irmãos ou irmãs. Isso indica que eles tampouco têm percebido o Corpo de Cristo.

A Igreja é uma, ela não pode ser dividida. Se uma pessoa realmente tem conhecido o Corpo, não pode reconhecer nenhum tipo de individualismo; ela não pode fazer parte de nenhuma facção ou círculo pequeno.

Se você tem experimentado genuinamente o Corpo de Cristo, terá consciência de que algo vai mal cada vez que começa a mostrar o seu individualismo, e por certo lhe será impossível seguir. Ou, se não, ao você ou vários outros darem um passo equivocado, essa consciência do Corpo lhes recordará que assim vocês se desconectam dos outros filhos de Deus e, dessa forma, ela impedirá vocês de seguirem. Existe algo dentro de você que o freia, que lhe fala, admoesta, adverte ou põe obstáculos. Essa consciência da vida pode nos evitar toda mancha de tendência para divisão.

Consciência do Corpo e Trabalho Independente

Se tivermos consciência do Corpo, compreenderemos imediatamente que o Corpo é um. Desse modo, aquele que está envolvido na obra espiritual não pode ser individualista.

Segundo o que pensam algumas pessoas, o importante é deixar a impressão de suas mãos sobre as coisas; de outra forma, considera que essas coisas não servem de nada. Tudo o que ele faz é considerado como de valor espiritual; e tudo o que não é ele quem faz não tem valor nenhum. Quando ele prega e ninguém é salvo, sente-se deprimido. Quando prega e as pessoas são salvas, mostra-se agradavelmente surpreendido. Isso ocorre porque considera a obra como sua obra pessoal.

Porém, no momento em que os filhos de Deus percebem a unidade do Corpo, compreendem imediatamente a unidade da obra. No instante em que vêem que o Corpo é um, são resgatados de seus esforços individuais, visto que agora estão vendo que a obra é do Corpo. Isso não significa que a pessoa já não pode agir como indivíduo. Mas simplesmente significa que já não pode considerar a obra como sua propriedade exclusiva. Tanto se a obra é feita por ele ou não, isso não o preocupa mais; o que o preocupa agora é que a obra seja feita.

Quanto necessito dar-me conta de que eu não posso ser senão um pequeno vaso na obra; eu não posso monopolizá-la. Não posso atrever-me a considerar a obra e o que resulta dela como coisas minhas. Se insisto em que tudo tem de ser feito por mim, então não tenho compreendido o Corpo. No momento em que capto o Corpo, dou-me conta de que tanto o meu labor como o de outros são de proveito tanto para mim como para o Corpo. E que toda a glória seja do Senhor e todas as bênçãos da Igreja.

Visto que o Corpo é um, pouco importa se a obra é feita por ele ou por outros. Tanto se a obra é sua como se é de outros, toda glória vai para o Senhor e todas as bênçãos vão para a Igreja. Se alguém vê o Corpo de Cristo, haverá nele de maneira natural esta consciência: Que o Corpo é um, e que por conseguinte a obra é uma.

Texto extraído do livro “O Corpo de Cristo: Uma Realidade”, Watchman Nee, Editora dos Clássicos.

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